Por Nuno Serras Pereira,
«Neste texto na sua grande maioria recorrer-se-á às próprias palavras de S. João Paulo II - trasladadas da sua encíclica o Evangelho da vida e também de discursos seus -, mas algumas, incluindo uma ou outra adaptação que estão em absoluta concordância com a lógica do texto, serão da minha responsabilidade.
O Evangelho da vida está no centro da mensagem de Jesus. Ao apresentar o núcleo central da sua missão redentora, Jesus diz: «Eu vim para que tenham vida, e a tenham em abundância». Ele fala daquela vida «nova» e «eterna» que consiste na comunhão com o Pai, à qual todo o homem é gratuitamente chamado no Filho, por obra do Espírito Santificador. Mas é precisamente em tal «vida» que todos os aspectos e momentos da vida do homem adquirem pleno significado. O homem é, assim, chamado a uma plenitude de vida que se estende muito para além das dimensões da sua existência terrena, porque consiste na participação da própria vida de Deus. Mas a sublimidade desta vocação sobrenatural revela a grandeza e o valor precioso da vida humana, inclusive já na sua fase temporal. Com efeito, a vida temporal é condição basilar, momento inicial e parte integrante do processo global e unitário da existência humana: um processo que, para além de toda a expectativa e merecimento, fica iluminado pela promessa e renovado pelo dom da vida divina, que alcançará a sua plena realização na eternidade.
Todo o homem sinceramente aberto à verdade e ao bem pode, pela luz da razão e com o secreto influxo da graça, chegar a reconhecer, na lei natural inscrita no coração, o valor sagrado da vida humana desde o seu início até ao seu termo, e afirmar o direito que todo o ser humano tem de ver plenamente respeitado este seu bem primário. Sobre o reconhecimento de tal direito é que se funda a convivência humana e a própria comunidade política. Todos são chamados a tutelar este direito, mas de um modo particular, devem defendê-lo e promovê-lo os crentes em Cristo, conscientes daquela verdade maravilhosa, recordada pelo Concílio Vaticano II: «Pela sua encarnação, Ele, o Filho de Deus, uniu-Se de certo modo a cada homem». De facto, neste acontecimento da salvação, revela-se à humanidade não só o amor infinito de Deus que «amou de tal modo o mundo que lhe deu o seu Filho único», mas também o valor incomparável de cada pessoa humana.
Verdadeiramente grande é o valor da vida humana, se o Filho de Deus a assumiu e fez dela o lugar onde se realiza a salvação para a humanidade inteira!
A vida é sempre um bem. Esta é uma intuição ou até um dado de experiência, cuja razão profunda o homem é chamado a compreender.
Por que motivo a vida é um bem? Esta pergunta percorre a Bíblia inteira, encontrando já nas primeiras páginas uma resposta eficaz e admirável. A vida que Deus dá ao homem é diversa e original, se comparada com a de qualquer outra criatura viva, dado que ele, apesar de aparentado com o pó da terra é, no mundo, manifestação de Deus, sinal da sua presença, vestígio da sua glória. Isto mesmo quis sublinhar Santo Ireneu de Lião, com a célebre definição: «A glória de Deus é o homem vivo». Ao homem foi dada uma dignidade sublime, que tem as suas raízes na ligação íntima que o une ao seu Criador: no homem, brilha um reflexo da própria realidade de Deus. Assim, chega ao seu auge a verdade cristã acerca da vida. A dignidade desta não está ligada apenas às suas origens, à sua proveniência de Deus, mas também ao seu fim, ao seu destino de comunhão com Deus no conhecimento e no amor d'Ele. É à luz desta verdade que Santo Ireneu especifica e completa a sua exaltação do homem: «glória de Deus» é, sim, «o homem vivo», mas «a vida do homem consiste na visão de Deus».
Por causa do mistério do Verbo de Deus que Se fez carne cada homem está confiado à solicitude materna da Igreja. Por isso, qualquer ameaça à dignidade e à vida do homem não pode deixar de se repercutir no próprio coração da Igreja, é impossível não a tocar no núcleo da sua fé na encarnação redentora do Filho de Deus, não pode passar sem a interpelar na sua missão de anunciar o Evangelho da vida pelo mundo inteiro a toda a criatura. O Evangelho do amor de Deus pelo homem, o Evangelho da dignidade da pessoa e o Evangelho da vida são um único e indivisível Evangelho.
«Como há um século, oprimida nos seus direitos fundamentais era a classe operária, e a Igreja com grande coragem tomou a sua defesa, proclamando os sacrossantos direitos da pessoa do trabalhador, assim agora, quando outra categoria de pessoas é oprimida no direito fundamental à vida, a Igreja sente que deve, com igual coragem, dar voz a quem a não tem. O seu é sempre o grito evangélico em defesa dos pobres do mundo, de quantos estão ameaçados, desprezados e oprimidos nos seus direitos humanos».
Espezinhada no direito fundamental à vida, é hoje uma grande multidão de seres humanos débeis, como o são, em particular, as crianças ainda não nascidas e os enfermos e idosos. Se, ao findar do século passado, não fora consentido à Igreja calar perante as injustiças então reinantes, menos ainda pode ela calar hoje, quando às injustiças sociais do passado — infelizmente ainda não superadas — se vêm somar, em tantas partes do mundo, injustiças e opressões ainda mais graves, mesmo se disfarçadas em elementos de progresso com vista à organização de uma nova ordem mundial.
Deus proclama-Se Senhor absoluto da vida do homem, formado à sua imagem e semelhança. A vida humana possui, portanto, um carácter sagrado e inviolável, no qual se reflecte a própria inviolabilidade do Criador. Por isso mesmo, será Deus que Se fará juiz severo de qualquer violação do mandamento «não matarás», colocado na base de toda a convivência social. O cumprimento do preceito «não matarás» é condição indispensável para poder entrar na vida eterna. Deus é o defensor do inocente. Deus comprova, assim também, que não Se alegra com a perdição dos vivos. Com esta, apenas Satanás se pode alegrar: foi pela sua inveja que a morte entrou no mundo. «Assassino desde o princípio», o diabo é também «mentiroso e pai da mentira»: enganando o homem, levou-o para metas de pecado e de morte, apresentadas como objectivos e frutos de vida.
Da sacralidade da vida dimana a sua inviolabilidade, inscrita desde as origens no coração do homem, na sua consciência. O preceito relativo à inviolabilidade da vida humana ocupa o centro dos «dez mandamentos» na aliança do Sinai. Nele se proíbe, antes de mais, o homicídio: «Não matarás», «não causarás a morte do inocente e do justo». O mandamento «não matarás», contido e aprofundado no mandamento positivo do amor do próximo, é confirmado em toda a sua validade pelo Senhor Jesus. Ao jovem rico que Lhe pede «Mestre, que hei de fazer de bom para alcançar a vida eterna?», responde: «Se queres entrar na vida eterna, cumpre os mandamentos». E, logo em primeiro lugar, cita «não matarás».
Defender e promover, venerar e amar a vida de cada ser humano é tarefa que Deus confia a cada homem.
Nos dias de hoje, a percepção da gravidade da eutanásia vai-se obscurecendo progressivamente em muitas consciências. A aceitação da eutanásia na mentalidade, nos costumes e na própria lei, é sinal eloquente de uma perigosíssima crise do sentido moral que se torna cada vez mais incapaz de distinguir o bem do mal, mesmo quando está em jogo o direito fundamental à vida. Diante de tão grave situação, impõe-se mais que nunca a coragem de olhar frontalmente a verdade e chamar as coisas pelo seu nome, sem ceder a compromissos com o que nos é mais cómodo, nem à tentação de auto-engano. A propósito disto, ressoa categórica a censura do Profeta: «Ai dos que ao mal chamam bem, e ao bem, mal, que têm as trevas por luz e a luz por trevas».
Já o Concílio Vaticano II advertia que a consciência pode errar quer por ignorância invencível quer porque o homem não cuidando de procurar a verdade e o bem, aos poucos, pelo hábito do pecado, torna a consciência quase cega (GS 16). Por isso, tem que ser formada. Esta é, porventura, uma das principais razões por que é necessário o acolhimento e a fidelidade à verdade ensinada pelo Magistério da Igreja, que foi, precisamente, instituído para o serviço, ou seja, para a formação das consciências. De facto, é o único e mesmo Deus que sussurra ou brada na consciência e ensina ou guia pelo Magistério - “Quem vos ouve, a Mim Me ouve e quem vos rejeita a Mim rejeita”, disse Cristo aos Seus apóstolos e seus sucessores.
A tolerância legal do aborto provocado ou da eutanásia não pode, de modo algum, fazer apelo ao respeito pela consciência dos outros, precisamente porque a sociedade tem o direito e o dever de se defender contra os abusos que se possam verificar em nome da consciência e com o pretexto da liberdade.
Reivindicar o direito à eutanásia e reconhecê-lo legalmente, equivale a atribuir à liberdade humana um significado perverso e iníquo: o significado de um poder absoluto sobre os outros e contra os outros. Mas isto é a morte da verdadeira liberdade: «Em verdade, em verdade vos digo: todo aquele que comete o pecado é escravo do pecado».
É totalmente falsa e ilusória a comum defesa, que aliás justamente se faz, dos direitos humanos — como por exemplo o direito à saúde, à casa, ao trabalho, à família e à cultura, — se não se defende com a máxima energia o direito à vida, como primeiro e fontal direito, condição de todos os outros direitos da pessoa.
Depois de um longo processo histórico em que se descobriu o conceito de «direitos humanos» — como direitos inerentes a cada pessoa e anteriores a qualquer Constituição e legislação dos Estados —, incorre-se hoje numa estranha contradição: precisamente numa época em que se proclamam solenemente os direitos invioláveis da pessoa e se afirma publicamente o valor da vida, o próprio direito à vida é praticamente negado e espezinhado, particularmente nos momentos mais emblemáticos da existência, como são o nascer e o morrer.
A estas nobres proclamações contrapõem-se, infelizmente nos factos, a sua trágica negação. Esta é ainda mais desconcertante, antes mais escandalosa, precisamente porque se realiza numa sociedade que faz da afirmação e tutela dos direitos humanos o seu objectivo principal e, conjuntamente, o seu título de glória. Como pôr de acordo essas repetidas afirmações de princípio com a contínua multiplicação e a difusa legitimação dos atentados à vida humana? ... Estes atentados encaminham-se exactamente na direcção contrária à do respeito pela vida e representam uma ameaça frontal a toda a cultura dos direitos do homem. É uma ameaça capaz, em última análise, de pôr em risco o próprio significado da convivência democrática: de sociedade de «con-viventes», as nossas cidades correm o risco de passar a sociedade de excluídos, marginalizados, irradiados e suprimidos.
Quando a lei, votada segundo as chamadas regras democráticas, permite o aborto, o ideal democrático, que só é verdadeiramente tal quando reconhece e tutela a dignidade de toda a pessoa humana, é atraiçoado nas suas próprias bases: Como é possível falar ainda de dignidade de toda a pessoa humana, quando se permite matar a mais fraca e a mais inocente? Em nome de que justiça se realiza a mais injusta das discriminações entre as pessoas, declarando algumas dignas de ser defendidas, enquanto a outras, esta dignidade é negada? Deste modo e para descrédito das suas regras, a democracia caminha pela estrada de um substancial totalitarismo. O Estado deixa de ser a «casa comum», onde todos podem viver segundo princípios de substancial igualdade, e transforma-se num Estado tirano, que presume poder dispor da vida dos mais débeis e indefesos em nome de uma utilidade pública que, na realidade, não é senão o interesse de alguns.
Como disse João Paulo II a propósito das leis que admitem o aborto: Pede-se «aos Pastores, aos fiéis e aos homens de boa vontade, em especial se são legisladores, um renovado e concorde empenho para modificar as leis injustas que legitimam ou toleram essas violências. Não se renuncie a nenhuma tentativa de eliminar o crime legalizado ...». E ainda: Não «há nenhuma razão para aquele tipo de mentalidade derrotista que considera que as leis que se opõem ao direito à vida - as que legalizam o aborto, a eutanásia, a esterilização e os métodos de planeamento familiar que se opõem à vida e à dignidade do matrimónio - são inevitáveis e até quase uma necessidade social. Pelo contrário, são um gérmen de corrupção da sociedade e dos seus fundamentos.».
De facto, não pode haver paz verdadeira sem respeito pela vida, em especial se é inocente e indefesa como a das crianças ainda não nascidas. É uma exigência de coerência básica que quem procura a paz defenda a vida. Não é possível uma acção efectiva pela paz sem uma oposição de igual esforço aos ataques contra a vida em todas as suas fases.
«A lei humana tem valor de lei enquanto está de acordo com a recta razão: derivando, portanto, da lei eterna. Se, porém, contradiz a razão, chama-se lei iníqua e, como tal, não tem valor, mas é um acto de violência. Toda a lei constituída pelos homens tem força de lei só na medida em que deriva da lei natural. Se, ao contrário, em alguma coisa está em contraste com a lei natural, então não é lei mas sim corrupção da lei.». «Neste caso, a própria autoridade deixa de existir, degenerando em abuso do poder».
Ora, a primeira e mais imediata aplicação desta doutrina diz respeito à lei humana que menospreza o direito fundamental e primordial à vida, direito próprio de cada homem. Assim, as leis que legitimam a eliminação directa de seres humanos inocentes, por meio da eutanásia estão em contradição total e insanável com o direito inviolável à vida, próprio de todos os homens, e negam a igualdade de todos perante a lei. As leis que autorizam e favorecem a eutanásia colocam-se, pois, radicalmente não só contra o bem do indivíduo, mas também contra o bem comum e, por conseguinte, carecem totalmente de autêntica validade jurídica. O aborto e a eutanásia são, portanto, crimes que nenhuma lei humana pode pretender legitimar.
Lembrem-se todos os católicos, em particular os legisladores e demais políticos, que no caso de uma lei intrinsecamente injusta, como aquela que admite o aborto, a reprodução extra-corpórea ou a eutanásia é sempre gravemente ilícito conformar-se com ela, ou participar numa campanha de opinião a favor de uma lei de tal natureza, ou dar-lhe a aprovação com o próprio voto. Se alguém o fizer não só atenta gravemente contra o seu bem espiritual, mas põe em perigo a sua salvação eterna e não se encontra em estado de poder receber a Sagrada Comunhão: «A rejeição da vida do homem, nas suas diversas formas, é realmente uma rejeição de Cristo.». Pois, como disse o mesmo Cristo «tudo o que fizerdes ao mais pequenino dos Meus irmãos a Mim mesmo o fizestes». Recordem-se os sacerdotes que têm cura de almas que a teor do cânon 915 do Código de Direito Canónico têm o dever, depois de um juízo prudente, de negar a tais pessoas a comunhão eucarística.
Matar ou proporcionar que se organize a morte do ser humano, no qual está presente a imagem de Deus, é pecado de particular gravidade.
Os preceitos morais negativos, isto é, aqueles que declaram moralmente inaceitável a escolha de uma determinada acção- tais como a eutanásia e colaboração no suicídio - têm um valor absoluto para a liberdade humana: valem sempre e em todas as circunstâncias, sem excepção. Indicam que a escolha de determinado comportamento é radicalmente incompatível com o amor a Deus e com a dignidade da pessoa, criada à sua imagem: por isso, tal escolha não pode ser resgatada pela bondade de qualquer intenção ou consequência, está em contraste insanável com a comunhão entre as pessoas e contradiz a decisão fundamental de orientar a própria vida para Deus.
A introdução de legislações injustas põe frequentemente os homens moralmente rectos frente a difíceis problemas de consciência em matéria de colaboração, por causa da imperiosa afirmação do próprio direito de não ser obrigado a participar em acções moralmente más. Às vezes, as opções que se impõem tomar, são dolorosas e podem requerer o sacrifício de posições profissionais consolidadas ou a renúncia a legítimas perspectivas de promoção na carreira. Noutros casos, pode acontecer que o cumprimento de algumas acções, em si mesmas indiferentes ou mesmo até positivas, previstas no articulado de legislações globalmente injustas, consinta a salvaguarda de vidas humanas ameaçadas. Mas, por outro lado, pode-se justamente temer que a disponibilidade para realizar tais acções não só provoque um escândalo e favoreça o enfraquecimento da oposição necessária aos atentados contra a vida, como insensivelmente induza também a conformar-se cada vez mais com uma lógica permissiva.
Para iluminar esta difícil questão moral, é preciso recorrer aos princípios gerais referentes à cooperação em acções moralmente más. Os cristãos, como todos os homens de boa vontade, são chamados, sob grave dever de consciência, a não prestar a sua colaboração formal em acções que, apesar de admitidas pela legislação civil, estão em contraste com a lei de Deus. Na verdade, do ponto de vista moral, nunca é lícito cooperar formalmente no mal. E essa cooperação verifica-se quando a acção realizada, pela sua própria natureza ou pela configuração que tem assumido num contexto concreto, se qualifica como participação directa num acto contra a vida humana inocente ou como aprovação da intenção moral do agente principal. Tal cooperação nunca pode ser justificada invocando o respeito da liberdade alheia, nem apoiando-se no facto de que a lei civil a prevê e requer: com efeito, nos actos cumpridos pessoalmente por cada um, existe uma responsabilidade moral, à qual ninguém poderá jamais subtrair-se e sobre a qual cada um será julgado pelo próprio Deus.
Recusar a própria participação para cometer uma injustiça é não só um dever moral, mas também um direito humano basilar. Se assim não fosse, a pessoa seria constrangida a cumprir uma acção intrinsecamente incompatível com a sua dignidade e, desse modo, ficaria radicalmente comprometida a sua própria liberdade, cujo autêntico sentido e fim reside na orientação para a verdade e o bem. Trata-se, pois, de um direito essencial que, precisamente como tal, deveria estar previsto e protegido pela própria lei civil. Nesse sentido, a possibilidade de se recusar a participar na fase consultiva, preparatória e executiva de semelhantes actos contra a vida, deveria ser assegurada aos médicos, aos outros profissionais da saúde e aos responsáveis pelos hospitais, clínicas e casas de saúde. Quem recorre à objecção de consciência deve ser salvaguardado não apenas de sanções penais, mas ainda de qualquer dano no plano legal, disciplinar, económico e profissional.
Neste grande esforço por uma nova cultura da vida, somos sustentados e fortalecidos pela confiança de quem sabe que o Evangelho da vida, como o Reino de Deus, cresce e dá frutos abundantes. Certamente é enorme a desproporção existente entre os meios numerosos e potentes, de que estão dotadas as forças propulsoras da «cultura da morte», e os meios de que dispõem os promotores de uma «cultura da vida e do amor». Mas nós sabemos que podemos confiar na ajuda de Deus, para Quem nada é impossível.
A Igreja movida de pungente solicitude pela sorte de cada homem e mulher repete-vos é urgente uma grande oração pela vida, que atravesse Portugal inteiro. Com iniciativas extraordinárias e na oração habitual, de cada comunidade cristã, de cada grupo ou associação, de cada família e do coração de cada crente eleve-se uma súplica veemente a Deus, Criador e amante da vida. O próprio Jesus nos mostrou com o seu exemplo que a oração e o jejum são as armas principais e mais eficazes contra as forças do mal, e ensinou aos seus discípulos que alguns demónios só desse modo se expulsam. Encontremos, pois, novamente a humildade e a coragem de orar e jejuar, para conseguir que a força que vem do Alto faça ruir os muros de enganos e mentiras que escondem, aos olhos de muitos dos nossos irmãos e irmãs, a natureza perversa de comportamentos e de leis contrárias à vida, e abra os seus corações a propósitos e desígnios inspirados na civilização da vida e do amor.
Uma palavra particular merecem os Catequistas que têm a alta missão de anunciar o Evangelho da Vida às crianças e aos jovens, encharcados que estão numa cultura de morte. A vossa palavra e o vosso testemunho serão de importância vital para que eles saibam resistir pela vida fora às seduções daquele que é homicida desde o princípio e que sempre procura e fomenta a morte, o Maligno.
Importa muito ter presente que uma autêntica pastoral da vida não pode ser simplesmente delegada em movimentos específicos, embora sempre meritórios, que actuam no campo sócio-político. Ela deve permanecer sempre como parte integrante da pastoral eclesial, à qual compete anunciar o Evangelho da vida: Na mobilização por uma nova cultura da vida todos têm um papel importante a desempenhar.
A Igreja chama as famílias a não se renderem, mas a tomarem aquelas decisões que, tendo em conta as possibilidades concretas, levem a restabelecer uma ordem justa na afirmação e promoção do valor da vida. Nesta perspectiva, convém sublinhar que não basta eliminar as leis iníquas. Mas terão de ser removidas as causas que favorecem os atentados contra a vida, sobretudo garantindo o devido apoio à família: a política familiar deve constituir o ponto fulcral e o motor de todas as políticas sociais. Impõe-se, além disso, reordenar as políticas do emprego, de urbanização, da habitação, dos serviços sociais, para se conseguir conciliar entre si os tempos do trabalho e da família, tornando possível um efectivo cuidado dos idosos.»
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